Setor funerário se mobiliza para alterar reforma tributária

Setor funerário se mobiliza para alterar reforma tributária

A reforma tributária pode elevar o valor dos impostos aplicados aos serviços funerários entre 130% e 206%. É o que alegam empresas funerárias, cemitérios e crematórios que têm chamado a atenção do governo para o que caracterizam como um enquadramento equivocado do setor na reforma.

Empresários afirmam que são regulados e fiscalizados como ocorre no setor de saúde, do qual são o último elo, mas que na reforma não foram tratados como tal.

“Nós somos fiscalizados por todas as entidades de saúde, mas quando é para pagar imposto não somos enquadrados como tal. Mas nós somos do setor de saúde, somos o elo final. Infelizmente, quando o hospital e o médico não resolvem, o final da cadeia da saúde são as funerárias e o cemitério”, explica Cláudio Bentes, que é presidente da Associação dos Cemitérios e Crematórios do Brasil (Acembra).

De acordo com os cálculos feitos por tributaristas a pedido da entidade, hoje a alíquota média para os serviços funerários privados é de 8,65% (5% de ISS, 0,65% de PIS, 3% de Cofins). Com a reforma, porém, ela pode chegar a 26,5%. Isso significa que, no caso de um serviço que custa em média R$ 3 mil (sem contar os tributos), os impostos saltariam de R$ 259,50 para R$ 795, levando o preço final de R$ 3.259,50 para R$ 3.795.

O impacto pode ser ainda maior, caso a alíquota padrão dos impostos sobre o consumo seja de 28% após a reforma, como calcula o Ministério da Fazenda, em vez dos 26,5% calculados inicialmente.

Aprovada em julho pela Câmara, a proposta de regulamentação da reforma tributária chegou para aprovação no Senado Federal, onde será votada na Comissão de Constituição e Justiça e no Plenário. No entanto, a Comissão de Assuntos Econômicos tem promovido uma série de audiências para entender as demandas dos mais diversos setores a respeito dos impactos da reforma tributária.

No dia 12 de setembro, representantes do setor funerário levaram suas demandas a uma dessas audiências. Durante a sessão, Heleno Torres, professor de Direto Financeiro do departamento de Direito Econômico, Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), expressou seu estranhamento em relação ao tratamento dado ao setor na regulamentação da reforma.

Ao tratar da redução da alíquota conferida aos serviços de saúde, que constam do Anexo 3 do PLP 68/2024, o tributarista afirma que a inserção dos serviços funerários está de acordo com as normas da reforma tributária. “Aos olhos do governo parece que está se criando mais uma exceção à alíquota geral, mas não, trata-se da continuidade do serviço de saúde que é prestado por este segmento e reconhecido como tal pela Agência de Vigilância Sanitária e pelas legislações municipais”, disse.

No dia 13 de agosto, após a publicação de reportagens sobre o possíveis aumentos na tributação dos serviços funerários, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom) publicou uma nota refutando as informações. O governo afirma que o cálculo de aumento de 206% na taxação desconsidera o sistema de recuperação de créditos criado pela reforma, e que o regime fiscal do Simples Nacional será mantido para as micro e pequenas empresas do setor.

A Secom chamou os textos sobre o tema de “peças de desinformação”. “Este cálculo [aumento de 206%] desconsidera que o novo modelo de tributação permitirá ao contribuinte recuperar integralmente os tributos pagos em suas aquisições, na forma de crédito. Além disso, as propostas envolvidas na mudança sobre o arranjo dos impostos no país não alteram o regime de tributação do Simples Nacional, que continuará como opção para as empresas com receita bruta anual de até R$ 4,8 milhões”.

Em sua nota, a Secom ainda cita o Ministério da Fazenda ao afirmar que a Emenda Constitucional 132, que criou bases para a implementação da reforma, não permite a diferenciação de alíquota para bens ou serviços não previstos na própria emenda – e o setor funerário não foi incluído. Por essa razão, a secretaria alega que seria inconstitucional a redução das alíquotas do setor pelo PLP 68/2024, que é um projeto de regulamentação da reforma.

Outro ponto destacado pela secretaria é que seria “enganoso comparar a alíquota atual com a expectativa de alíquota após a implementação da reforma”, e mais uma vez cita a apropriação de créditos dos tributos pagos pelos insumos em todas as etapas do setor como uma forma de limitar a tributação.

Setor funerário é intensivo em mão de obra

Cláudio Bentes explicou à Gazeta do Povo que o reenquadramento do setor não é a criação de uma exceção à nova regra, mas uma correção, já que as empresas funerárias são parte do sistema de saúde. Portanto, seria apenas a extensão do benefício fornecido àquele sistema.

Na reforma tributária, planos e convênios de saúde terão 60% de redução na alíquota do IVA. No caso do setor funerário, uma redução dessa monta faria com que a taxação caísse dos alegados 26,5% para 10,6% – taxação um pouco mais próxima da média de 8,65% de impostos que recaem sobre o setor hoje.

Bentes ainda destaca que o ramo funerário tem algumas peculiaridades que não estão sendo consideradas pelo governo. A primeira delas é em relação ao montante total de empresas cadastradas no regime do Simples Nacional.

Segundo o presidente da Abacem, apenas 30% dos CNPJs do ramo são cadastrados no Simples, enquanto 60% estão no regime de lucro presumido e 10%, no de lucro real. Sendo assim, a isenção que a reforma tributária proporciona para micro e pequenas que adotam o regime simplificado afetará menos de um terço das empresas funerárias.

Outro ponto destacado por Bentes é que os serviços funerários são intensivos em mão de obra. “É um ramo que emprega muita mão de obra. Cerca de 50% dos nossos custos são com mão de obra. Isso acontece porque nós trabalhamos 24 horas por dia, 365 dias por ano. Todo dia, à noite, de madrugada estamos tralhando”, esclareceu.

Os números de faturamento da indústria do luto são divergentes. Há estimativas que variam de R$ 7 bilhões a R$ 13 bilhões. Bentes afirma que o total é de cerca de R$ 10 bilhões por ano, com emprego de aproximadamente 250 mil pessoas.

Ele diz desconhecer outra atividade que tenha essa proporção entre o tamanho do faturamento e o uso de mão de obra contratada. Além disso, argumenta que os serviços prestados não podem ser terceirizados, pois se trata de “emprego direto com carteira assinada nas nossas empresas”.

Cadeia de produção do setor funerário é curta e limita abatimento de créditos

Os representantes do setor funerário ainda alegam que, por ser intensivo em mão de obra, ele não tem uma grande cadeia de produção, além de ter uso reduzido de insumos – dentre os quais urnas funerárias, caixões, flores, roupas e produtos para preparar corpos.

Além disso, a própria cadeia de produção desses produtos também não é extensa. Em alguns casos, como o das flores, por exemplo, as funerárias podem comprar diretamente de produtores. Bentes ainda explica que, se forem produtores rurais que gozam de isenção na reforma tributária, o recurso de abatimento de créditos fica mais prejudicado.

Após a resposta do governo, a Abacem refez os cálculos do impacto nos impostos, considerando que o setor utilize 25% de insumos e que consiga 100% de abatimento dos créditos mencionados pelo governo. Nesses casos, a associação projeta que o aumento dos impostos chegue a cerca de 130% – quer dizer, mesmo assim a taxação vai mais que dobrar em relação à atual.

Robson Posnik, presidente do Sindicato dos Cemitérios e Crematórios do Paraná, afirma que a taxação extra inevitavelmente chegará aos preços dos serviços. Ele destaca que em momentos como a pandemia de Covid-19, o setor foi considerado essencial e fundamental na questão sanitária, mas que na hora da cobrança de impostos essa visão não se manteve.

Aumento na taxação de serviços funerários pode impactar municípios

Um dos pontos destacados por Robson é o impacto que o incremento na taxação pode trazer para os pequenos municípios. Ele afirma que praticamente todo município brasileiro tem uma funerária e um cemitério, e que em geral as populações são atendidos por empresas privadas.

Desde a década de 1970, diz, as administrações municipais deixaram de investir em cemitérios e funerárias públicos. Os serviços privados tomaram esse lugar, inclusive junto à população de baixa renda.

Caso o setor não consiga se enquadrado como serviço de saúde na reforma, ele avalia que até mesmo as administrações municipais podem ser afetadas, uma vez que mais gente pode pedir socorro às prefeituras para enterrar familiares.

Outro ponto é o acesso a planos funerários. Posnik afirma que grande parte das famílias de baixa renda opta por esse tipo de financiamento para garantir um enterro digno para os parentes. O aumento dos tributos também pode impactar esse setor, que tem garantido às classes menos abastadas o acesso a esses serviços.

Fonte Original do Artigo: www.gazetadopovo.com.br

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