
Professor descobre câncer de pulmão e dá aula sobre doença – 06/03/2025 – Equilíbrio e Saúde
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- 06/03/2025
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Bryant Lin estava diante de sua turma na Universidade Stanford em setembro, provavelmente uma das últimas aulas que ele daria.
Com apenas 50 anos e não fumante, ele havia recebido o diagnóstico de câncer de pulmão em estágio 4 quatro meses antes. A doença é terminal, e Lin estimou que teria cerca de dois anos antes que o medicamento que estava tomando parasse de funcionar. Em vez de se afastar do trabalho, ele escolheu passar um trimestre ensinando sobre sua própria doença.
As inscrições para a aula se esgotaram quase que imediatamente. Agora a sala estava lotada, com alguns alunos forçados a se sentarem no chão. “É uma grande honra para mim, honestamente”, disse Lin, com a voz embargada. “O fato de vocês se inscreverem na minha aula.”
Ele contou aos alunos que queria começar com uma história que explicasse por que escolheu seguir a medicina. Ele pegou uma carta que havia recebido anos antes de um paciente que estava morrendo por doença renal crônica. O homem e sua família haviam decidido interromper a diálise, sabendo que ele morreria em breve.
Lin ajustou os óculos e leu a carta, emocionando-se novamente. “Queria agradecer muito por cuidar tão bem de mim na minha velhice”, disse, lendo as palavras de seu paciente. “Você me tratou como trataria seu próprio pai.”
Lin disse que esse último ato de gratidão lhe causou um impacto duradouro. E então explicou que criou com intenções semelhantes o curso de dez semanas “Do diagnóstico ao diálogo: a batalha em tempo real de um médico com o câncer”, na escola de medicina.
“Esta aula é parte da minha carta, parte do que estou fazendo para retribuir à minha comunidade enquanto passo por isso”, disse ele.
Mais tarde, um estudante de 18 anos em seu primeiro ano em Stanford assistiu a uma gravação da aula, que também estava aberta a alunos fora da escola de medicina. As vagas para o curso se esgotaram antes que ele pudesse se inscrever, mas, após enviar um email para Lin, o jovem recebeu permissão para acompanhar de forma online. Ele tinha perguntas que precisavam de respostas.
De médico a paciente
Lin desenvolveu uma tosse persistente e cada vez mais severa. Uma tomografia mostrou uma grande massa em seus pulmões, e uma broncoscopia confirmou o diagnóstico: câncer. Ele havia se espalhado para o fígado, os ossos e o cérebro, que sozinho tinha 50 crescimentos cancerígenos. Lin é casado e tem dois filhos adolescentes.
O diagnóstico foi particularmente cruel, dado seu trabalho. Professor clínico e médico de cuidados primários, Lin foi fundador do Centro de Pesquisa e Educação em Saúde Asiática de Stanford. Uma de suas prioridades tem sido o câncer de pulmão em não fumantes, uma doença que afeta desproporcionalmente as populações asiáticas.
Lin soube que seu câncer estava avançando rapidamente. Ele sentia dor na coluna e nas costelas e emagreceu. Seu médico o colocou em uma terapia direcionada projetada para atacar a mutação específica que impulsionava seu câncer. Ele também passou por quimioterapia, que causou náuseas e feridas na boca.
Após alguns ciclos do tratamento, sua respiração e tosse começaram a melhorar, e exames mostraram reduções drásticas na extensão do câncer. Ele continuou a ver pacientes e a ensinar, e começou a pensar sobre o que fazer com o tempo que lhe restava.
O paciente em diálise que estava morrendo havia escrito uma carta porque queria que o médico soubesse que ele era apreciado. Lin tinha algumas ambições para sua própria mensagem aos seus alunos. Ele gostava de pensar que alguns deles, tendo feito seu curso, poderiam se dedicar a algum aspecto do cuidado com o câncer. E queria que todos entendessem a humanidade como algo essencial na medicina.
A aula de Lin durava cerca de uma hora toda quarta-feira. Em uma delas ele falou sobre como ter conversas difíceis, em que enfatizou que os médicos deveriam ser honestos o suficiente para dizer “eu não sei” quando necessário —uma resposta que ele teve que aceitar como paciente em meio às incertezas de seu próprio diagnóstico.
Em outra aula, ele discutiu como a espiritualidade e a religião ajudam alguns pacientes a lidar com o câncer. Embora não seja religioso, ele contou que encontrou conforto nas ofertas dos outros para orar, cantar ou acender uma vela em seu nome.
Em uma sessão sobre o impacto psicológico do câncer, Lin falou sobre a decepção que sentiu após um exame mostrar que alguns de seus tumores haviam encolhido, mas não desaparecido. No fundo, ele ainda mantinha a esperança de um milagre.
Em suas aulas, Lin compartilhava como o diagnóstico de câncer o havia afetado, mas encaminhava seus alunos para especialistas —palestrantes convidados— quando era necessário mais exploração.
Para uma aula sobre cuidados primários, Lin convidou Christine Chan, que apresentou como “minha maravilhosa esposa”.
Graduada pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts e gerente de programa no Google DeepMind, Chan reconheceu que deixar de lado seu instinto de planejar o futuro foi difícil. “Temos que passar por isso um dia de cada vez”, ela disse.
Um trabalho ainda não concluído
Vendo Lin ensinar, muitas vezes me perguntei o que seus alunos estavam pensando. Como era se apegar a ele como professor, sabendo que seu prognóstico era tão grave?
Quando perguntei, alguns usaram a frase “oportunidade única na vida” para descrever o curso. Outros viam Lin como corajoso.
Foi difícil para alguns alunos conciliar sua atitude otimista com a gravidade do diagnóstico. Gideon Witchel, de Austin, Texas, foi um deles. Ele era o estudante de 18 anos que havia assistido a uma gravação da primeira aula. Uma vaga havia surgido, e agora ele estava matriculado.
Quando Witchel tinha 5 anos e sua irmã, 3, sua mãe, Danielle Witchel, recebeu diagnóstico de câncer de mama, mas ele nunca havia conversado com ela sobre isso em profundidade. Nunca havia conseguido dizer: “Conte-me a história do seu câncer”. Ele estava assistindo à aula de Lin na esperança de que isso o ajudasse a iniciar essa conversa.
O professor se referia à aula como sua carta aos alunos, mas ele havia elaborado uma carta real para seus filhos lerem depois que ele se fosse.
“Quer eu esteja aqui ou não, o que quero que vocês saibam é que eu amo vocês”, escreveu. “De todas as coisas que fiz que deram significado à minha vida, ser seu pai é a maior de todas.”
O ‘homem mais sortudo’
Para a última aula, Lin e seus alunos se reuniram em uma biblioteca no Hospital de Stanford.
Perto do final da aula, Lin ficou na frente da sala, dobrando e desdobrando um pedaço de papel onde havia impresso suas observações finais. Era hora de terminar sua carta.
Ele fez o que chamou de sua versão do discurso de despedida de Lou Gehrig, referindo-se ao jogador de beisebol do Hall da Fama do New York Yankees que morreu aos 37 anos de esclerose lateral amiotrófica, ou ELA, uma doença neurológica incurável.
“Durante o último trimestre, vocês ouviram sobre o golpe ruim que eu levei”, disse ele, ecoando partes do discurso de Gehrig no Yankee Stadium. “No entanto, hoje, considero-me o homem mais sortudo da face da Terra.”
Com isso, ele se emocionou. “Claro, sou sortudo.” Ele disse que era sortudo por ter seus dois filhos, que traziam alegria e risos para sua casa. Por ter seus assistentes, que tornaram o curso possível. Por ter a comunidade de Stanford, seus colegas e as pessoas do centro de saúde asiático. Seus alunos e residentes. Seus pacientes. Seus amigos. Seus pais. Sua esposa.
“Então, encerro dizendo que posso ter sofrido um golpe duro, mas tenho muito pelo que viver”, disse. “Obrigado. E foi uma honra.”
Parecia claro que Lin havia alcançado pelo menos alguns de seus objetivos. Quando ele perguntou se os alunos estavam pensando em carreiras no cuidado com o câncer, cerca de um terço levantou as mãos. Os que planejavam ser médicos me disseram que se lembrariam da história de Lin ao buscar entender a experiência de seus pacientes com a doença.
Para Witchel, o efeito do trimestre foi mais pessoal. Ele finalmente conversou com sua mãe sobre o câncer dela. Ela foi visitá-lo, ele lhe contou sobre a aula de Lin e abordou o assunto com ela.
E então descobriu que sua mãe tinha algo em comum com Lin: cartas. Durante sua doença, Danielle Witchel escreveu mensagens para familiares e amigos. Algumas lidavam com sua incerteza sobre se ela sobreviveria, bem como o efeito que seu diagnóstico poderia ter sobre seus filhos.
Depois que o câncer entrou em remissão, ela compilou os escritos junto a registros médicos, fotografias e outros documentos em um livro. Quando Gideon Witchel voltou para casa no feriado de Ação de Graças, se sentou à mesa da cozinha com o livro e seus pais.
Juntos eles alternaram entre ler o livro e conversar. Riram e choraram. Pela primeira vez, Gideon Witchel sentiu que estava interagindo com sua mãe como um adulto.